O texto de Malaquias 3.10 deve servir de base para a
prática do dízimo na igreja?
Entendo que
não.
Segue abaixo, de forma bastante objetiva as devidas
razões:
1. O livro do profeta Malaquias foi escrito
especificamente para o povo de Israel. Sua mensagem profética tem a sua razão e
o seu lugar próprio no tempo, e no espaço
"Sentença pronunciada pelo Senhor contra Israel,
por intermédio de Malaquias." (Ml 1.1)
"Assentar-se-á como derretedor e purificador de
prata; purificará os filhos de Levi e os refinará como ouro e como prata; eles
trarão ao Senhor justas ofertas. Então, a oferta de Judá e de Jerusalém será
agradável ao SENHOR, como nos dias antigos e como nos primeiros anos." (Ml
3.3)
"Porque eu, o SENHOR, não mudo; por isso, vós, ó
filhos de Jacó, não sois consumidos." (Ml 3.6)
Afirmar que as profecias e as orientações específicas
de Malaquias se aplicam "literalmente" à Igreja, é uma atitude que
implica na quebra de princípios básicos, sérios e confiáveis que norteiam uma
interpretação gramático-histórica da Bíblia;
"[...] os princípios do sistema
gramático-histórico de interpretação, que surgiram em antioquia pela primeira
vez como princípios pensados e conscientes, representam o modelo de
interpretação que mais bem corresponde aos pressupostos do Cristianismo
histórico quanto à natureza das Escrituras" (Nicodemus, 2004, p. 256)
Bentho (2003, p. 69-71) diz que a função da
hermenêutica e exegese bíblica, dentre outras, é compreender o sentido do texto
dentro de seu ambiente histórico-cultural e léxico-sintático. Qualquer
interpretação que tenta forçar o texto a dizer o que não diz, seja de forma
voluntária ou involuntária, com base em pressupostos ou premissas previamente
estabelecidos pelo intérprete, que ignora o contexto sob pretexto ideológico,
que ignora a mensagem e o propósito principal do livro e que não analisa o
texto à luz de outros, não deve ser confiável.
"Lembrai-vos da Lei de Moisés, meu servo, a qual
lhe prescrevi em Horebe para todo o Israel, a saber, Estatutos e juízos."
(Ml 4.4)
Não vivemos sob a Lei de Moisés:
"Porque eu, mediante a própria lei, morri para a
lei, a fim de viver para Deus. Estou crucificado com Cristo". (Gl 2.19)
"Ora, a lei não procede de fé, mas: Aquele que
observar seus preceitos por eles viverá" (Gl 3.12)
"Para a liberdade foi que Cristo nos libertou.
Permanecei, pois, firmes e não vos submetais, de novo, a jugo de
escravidão" (Gl 5.1)
3. Os que se utilizam de Ml 3.10, acabam por incorrer
na alegorese, ou seja, no abuso de uma interpretação fundamentada na escola
alegórica.
"Quem alegoriza fala ou escreve sobre alguma
coisa por intermédio de outra, procurando desvendar sentidos simbólicos,
espirituais ou ocultos. [...] De acordo com o método alegórico, o sentido
literal e histórico das Escrituras é completamente desprezado, e cada palavra e
acontecimento são transformados em alegoria de algum tipo, a fim de escapar de
dificuldades teológicas ou para sustentar certas crenças estranhas e alheias ao
texto bíblico. Assim, não interpreta o texto bíblico, mas perverte o verdadeiro
sentido deles, embora sob o pretexto de buscar um sentido mais profundo ou mais
espiritual" (Idem, 2003, p. 124)
O uso claro de alegorese em Ml 3.10, é afirmar que a
"casa do tesouro" e a "minha casa", citadas no texto se
aplicam aos templos cristãos. É equivocado também declarar, que as maldições
ali citadas, virão também sobre os crentes. Vale lembrar as palavras de Paulo
em Atos 17.24 "O Deus que fez o mundo e tudo o que nele existe, sendo ele
Senhor do céu e da terra, não habita em santuários feitos por mãos
humanas."
Muitos se utilizam do texto de Ml 3.7-11, tirando-o
do seu contexto, para colocar a "faca no pescoço dos simples",
amedrontando-os com maldições ou acusando-os de ladrões, no que diz respeito a
prática do dízimo. Volto a declarar que a Bíblia não deve ser interpretada segundo
as nossas conveniências.
Compreendo ainda pela Palavra, que na Igreja, o
dízimo não deve ter a sua prática incentivada a partir de Malaquias, mas sim, a
partir de Abraão (Gn 14.18-20) e Jacó (28.18-22) que contribuíram
voluntariamente, livre de qualquer preceito legal, sem medo de qualquer punição
ou castigo, sendo unicamente movidos por pura adoração em reconhecimento àquele
que provê todas as coisas.
As bases motivadoras e punitivas que norteiam as
contribuições financeiras na Igreja, estão prescritas em 2 Co 9.6-15
"E isto afirmo: aquele que semeia pouco pouco
também ceifará; e o que semeia com fartura com abundância também ceifará. Cada
um contribua segundo tiver proposto no coração, não com tristeza ou por
necessidade; porque Deus ama a quem dá com alegria. Deus pode fazer-vos abundar
em toda graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, ampla suficiência,
superabundeis em toda boa obra, como está escrito: Distribuiu, deu aos pobres,
a sua justiça permanece para sempre. Ora, aquele que dá semente ao que semeia e
pão para alimento também suprirá e aumentará a vossa sementeira e multiplicará
os frutos da vossa justiça, enriquecendo-vos, em tudo, para toda generosidade,
a qual faz que, por nosso intermédio, sejam tributadas graças a Deus. Porque o
serviço desta assistência não só supre a necessidade dos santos, mas também
redunda em muitas graças a Deus, visto como, na prova desta ministração,
glorificam a Deus pela obediência da vossa confissão quanto ao evangelho de
Cristo e pela liberalidade com que contribuís para eles e para todos, enquanto
oram eles a vosso favor, com grande afeto, em virtude da superabundante graça
de Deus que há em vós.
Graças a Deus pelo seu dom inefável!"
Dizimar e contribuir com outras ofertas, não pode ser
encarado por cristãos como um fardo ou jugo da lei. Deve sim, ser percebido
como um privilégio e como um ato livre e amoroso que reconhece em Deus o
sustentador, provedor e criador de todas as coisas.
extraído do blog do Pr Altair Germano
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